Diálogos
1998
Galeria SESC Paulista, São Paulo, SP
As esculturas realizadas por Renata Pedrosa são elaboradas a partir da reunião de materiais bem específicos. Látex, vaselina, cabelo e outras substâncias são utilizados a fim de criarem formas que revelam, sem portanto definir, um imaginário corpóreo. Ao invés de evocarem partes externas do corpo humano, suas obras sugerem partes internas tais como ossos, orgãos e cavidades. Quando a textura da pele é mencionada, ela o é, não tanto quanto invólucro, mas sim como superfície susceptível de enregistrar vestígios. Num todo, o corpo humano é concebido como um receptáculo de sensações e experiências. Sem recorrer à uma representação imitativa da natureza, os questionamentos presentes no trabalho de Renata Pedrosa surgem através do indescritível. Segundo a artista "são os sentidos que fornecem as ferramentas necessárias para a percepção". Confrontado as suas obras, o espectador ressente tensões entre uma abordagem tátil e visual de objetos tridimensionais. A complexidade inerente ao ato de percepção é exposta através de objetos ou instalações que incitam o espectador a considerar a impulsividade do gesto de tocar, à maneira de São Tomás: assim como a atitude de contemplação, ao jeito de um diletante. Em seus trabalhos, sensações tão opostas quanto repulsão e atração são provocadas devido às propriedades intrínsecas e simbólicas de cada material utilizado. Numa maneira bem pessoal de observar o mecanismo de percepção atual, gerado por uma civilização que se caracteriza pelo descomedimento de imagens e uma grande importância conferida à aparência externa das coisas, o trabalho de Renata Pedrosa apregoa um modo de percepção que não passa pelas imagens, mas sim pela assimilação e interiorização do que é exposto. Satre falava que quando um livro o interessava realmente, nenhuma imagem mental se formava. Atualmente, podemos constatar em algumas sociedades uma certa necessidade em guardar a aparência externa do corpo humano intacta, eternamente jovem e sem marcas. Dentro deste contexto, o trabalho de Renata Pedrosa transtorna tal conduta nos desvelando justamente a importância das impressões criadas com o passar do tempo. Em oposto ao comportamento do personagem descrito por Oscar Wilde, Dorian Gray, que para conservar sua beleza física preferia que a sua imagem representada num quadro, e não a sua própria pessoa, sofresse o efeito de experiências, a artista defronta tais alterações e as valoriza. Assim, os rastros que se imprimem no corpo, certamente assinalados após uma transformação experimentada pelo espírito, podem ser encarados como indicações positivas de uma evolução.

Adon Peres